Reinaldo

Maria Lúcia Fattorelli denuncia a falta de uma auditoria da crescente dívida pública

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O Sindifisco (Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal do Brasil), através da Delegacia Sindical de Curitiba, entrevistou Maria Lucia Fattorelli, auditora fiscal aposentada da Receita Federal e Coordenadora Nacional da Auditoria Cidadã da Dívida. No Equador, ela integrou a Comissão de Auditoria Integral da Dívida Pública em 2007-2008, que reduziu em 70% o montante total. Participou ativamente nos trabalhos da Comissão Parlamentar de Inquérito sobre a dívida realizada no Brasil. Em vídeo divulgado na internet e no site da DS, ela já havia esclarecido alguns pontos sobre o falso déficit da Previdência. Na matéria de hoje, aprofunda-se o assunto para um entendimento mais completo do tema. Confira a primeira parte da entrevista:

O que o artigo 194 da Constituição Federal estabelece?
O artigo 194 da Constituição é claro ao estabelecer a Seguridade Social como um sistema integrado composto pelas áreas da Saúde, Previdência e Assistência Social, ao passo que o artigo 195 trata do financiamento da Seguridade Social por toda a sociedade.

Sobre o financiamento da Seguridade Social, como é realizado esse sistema de arrecadações?
Ao mesmo tempo em que os constituintes criaram esse importante tripé do Artigo 194, estabeleceram também as fontes de receitas que são pagas por todos os setores, ou seja: As empresas contribuem sobre o lucro (CSLL) e pagam a parte patronal da contribuição sobre a folha de salários (INSS); Os trabalhadores contribuem sobre seus salários (INSS); E por fim, toda a sociedade por meio da contribuição embutida em tudo o que adquire (COFINS). Além dessas fontes, há contribuições sobre importação de bens e serviços, receitas provenientes de concursos e prognósticos, PIS, PASEP, entre outras. O artigo 195 também prevê a utilização de “recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios”, ou seja, recursos do orçamento fiscal também podem financiar a Seguridade Social, dada a sua importância para a sociedade.

Ainda que existam tantas fontes de financiamento, como é que o governo consegue apresentar um déficit da Previdência?
O desmembramento entre Previdência e Seguridade Social afronta a Constituição, que em momento algum diz que seu financiamento seria arcado somente pelas contribuições ao INSS, mas diz que existe a autorização para utilização dos recursos dos orçamentos fiscais para financiar o sistema. O governo não apresenta o orçamento dela como deveria, o propagandeado “déficit da Previdência” é uma farsa. Ele compara apenas a arrecadação da contribuição ao INSS paga por empregados e empregadores com a totalidade dos gastos com a Previdência, fazendo-se um desmembramento que não tem amparo na Constituição e sequer possui lógica defensável, pois são os trabalhadores os maiores contribuintes da COFINS.

Então, não existiria déficit real?
A Seguridade Social tem sido altamente superavitária nos últimos anos, em dezenas de bilhões de reais, conforme dados oficiais segregados pela Associação Nacional dos Fiscais da Previdência, que computa somente a arrecadação das contribuições sociais. A sobra de recursos foi de R$72,7 bilhões em 2005; R$ 53,9 bilhões em 2010; R$ 76,1 bilhões em 2011; R$ 82,8 bilhões em 2012; R$ 76,4 bilhões em 2013; R$ 55,7 bilhões em 2014, e R$11,7 bilhões em 2015.

E mais recentemente?
Em 2016 e 2017, devido às excessivas desonerações fiscais e também devido aos impactos da política monetária praticada pelo Banco Central que provocou a crise atual e levou milhões de pessoas ao desemprego, o volume das contribuições sociais não cobriu todas as despesas da Seguridade Social, porém, ainda assim não há que se falar em déficit, devido à autorização constitucional inserida no art. 195, que possibilita a utilização de recursos do orçamento fiscal para financiar a Seguridade Social, devido à sua importância para a sociedade.

E a dívida pública, qual a relação com a Previdência?
O reiterado superávit da Seguridade Social deveria estar fomentando debates sobre a melhoria da Previdência, da Assistência e da Saúde dos brasileiros e brasileiras. Isso não ocorre devido à prioridade na destinação de recursos para o pagamento da chamada dívida pública, que vem absorvendo cerca de metade do orçamento federal anualmente, e que nunca foi auditada, como manda a Constituição.

O que define a PEC 293/04, que tramita no Congresso Nacional? 
Ela vai aumentar o déficit da Previdência, porque transforma importantes contribuições sociais (Cofins e Pis) em imposto, portanto, modifica a natureza desses tributos, que destinam parte para a Previdência. Enquanto a arrecadação das contribuições sociais possui destinação vinculada à sua finalidade ligada à Seguridade Social, os impostos se destinam a um caixa único, e não podem ter destinação específica. Caso aprovada, essa PEC provocará um verdadeiro rombo no orçamento da Seguridade Social, que não mais contará com as receitas das contribuições extintas e transformadas em imposto. Recursos existem, e de sobra, mas a ameaça, diante da ganância financista, é grande e exige mobilização social para denunciar e barrar esses ataques aos direitos sociais.

Quais seriam as soluções para aumentar a arrecadação da Previdência?
Em primeiro lugar, a geração de emprego digno e o aumento salarial da população brasileira, que é muito mal remunerada. Temos atualmente, cerca de 15 milhões de pessoas desempregadas e mais de 60 milhões de pessoas na informalidade, ou seja, cerca de 75 milhões de trabalhadores e trabalhadoras não está contribuindo para o INSS. Para modificar isso, é necessário mudar radicalmente o modelo econômico aplicado no Brasil.

E o superávit primário?
Desde a década de 90, produzimos mais de R$1 trilhão de “Superávit Primário” e no mesmo período a dívida interna federal saltou de R$ 89 bilhões para R$ 4 trilhões, comprovando que a dívida cresceu por causa dos seus próprios mecanismos e não devido aos gastos sociais. Apesar disso, a legislação que faz parte do Sistema da Dívida coloca como prioridade absoluta o pagamento de juros e amortizações da chamada dívida pública, que nunca foi auditada, como manda a Constituição.

É uma espécie de sangria?
Instrumentos legais como a “Lei de Responsabilidade Fiscal” e mais recentemente a Emenda Constitucional 95/2016, drenam recursos para os gastos financeiros e impedem que grande parte dos recursos do país sejam utilizados para investimentos sociais. Os grandes bancos exercem uma chantagem diária, elevando os juros exigidos para adquirir novos títulos ofertados pelo governo, além de exigir a manutenção da liberdade de movimentação de capitais, benesses tributárias e contrarreformas. É preciso romper esse círculo vicioso, a começar por uma auditoria com participação social, para que a política econômica possa ser alterada.
Deu na DS Curitiba 

 

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Questão Brasil - 09/04/2019

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